sexta, 19 de abril de 2024
Educação Financeira nas EscolasCOLUNA

Educação Financeira nas Escolas

Silvia Alambert Hala

Educadora financeira de crianças e diretora de Conhecimento da Progress Educacional

Finanças: o que os pais devem ensinar às crianças?

Mesada, poupança e investimento são algumas das lições importantes antes da vida adulta

09 novembro 2021 - 13h55
Finanças: o que os pais devem ensinar às crianças?

Educar uma criança financeiramente começa em casa desde cedo. E por que desde cedo? Simplesmente porque para que uma nova aprendizagem se transforme em um hábito é preciso repetir, repetir e repetir. O ser humano aprende por repetição e por meio de modelos; e é dentro de casa, com seus familiares, que as crianças passam a maior parte do tempo e observam, ouvem e criam seus modelos.

Dinheiro, economias, escolhas inteligentes, mesada, cartão de crédito, sonhos e outros temas básicos da educação financeira e que fazem parte do dia a dia de pais e filhos parecem não existir, já que para as crianças e os jovens o acesso ao dinheiro, seja o de papel ou de plástico, parece algo muito distante e, portanto, algo sobre o qual eles julgam que não precisam saber neste momento. Já para os pais, a inexperiência dos filhos não permite que a conversa se torne fluida.   

É claro que nós, educadores financeiros, continuaremos engajados em promover programas de educação financeira para o ambiente escolar. Desenvolveremos games, aplicativos, cartilhas, gibis, livros e trabalharemos junto aos professores das escolas para que o tripé “escola-família-crianças” se fortaleça, contribuindo para a construção de uma sociedade menos dependente financeiramente de seu Governo e mais próspera. 

Mas é preciso, também, que os pais queiram fazer a educação financeira se tornar uma realidade na vida das crianças e jovens. Para reforçar essa iniciativa, eu apresento essas regras básicas da educação financeira, as quais todos os pais devem ensinar aos filhos antes que eles alcancem a vida adulta. 

1) Guarde no “porquinho”. Pague-se primeiro. Planeje os gastos futuros com o que restou

Ganhou dinheiro de pais, avós, tios ou padrinhos? No Natal, no aniversário, na Páscoa, sem motivo? Não importa quem deu ou quando deu. Guarde sempre uma parcela do que recebeu no “porquinho” — que também pode ser uma conta de investimento digital para menores — como forma de “remuneração a si mesmo”. O hábito de investir para o futuro para conquistar os grandes objetivos da vida deve se iniciar cedo e realizado com frequência.

2) O dinheiro é apenas uma ferramenta para alcançar sonhos

Quando as crianças começarem a pedir coisas, é hora de considerar a introdução da mesada, pois significa que elas já entenderam a função social do dinheiro. Assim, em posse do dinheiro delas, elas aprenderão a valorizar aquilo que adquirirem — ou até pensarão se realmente querem adquirir aquilo naquele momento. Para definir o valor ideal, uma dica é sondar com outros pais do convívio social quanto seus filhos recebem.

O valor não pode ser tão alto que a criança nem consiga se planejar para adquirir algo e nem tão baixo que a criança se sinta excluída de seu grupo. Seja qual for o valor, o mais importante é que ele caiba com folga no orçamento da família e acompanhe o aumento dos preços e do padrão de consumo das crianças ao longo dos anos. Para que a mesada cumpra o objetivo de ensinar as crianças a gerenciar o dinheiro é essencial que os pais nunca faltem com o pagamento.

3) Quem administra bem 1 real saberá administrar um milhão de reais

Se for optar pela semanada, quinzenada ou mesada, seja qual for o valor, ela deve durar por todo o período escolhido pela família. Se o dinheiro acabar antes do tempo, os pais não devem ceder. Nada de dar ou emprestar dinheiro. A criança precisa entender que dinheiro é um recurso finito e, mais do que isso, elas não devem se acostumar a recorrer a empréstimos, para evitar que levem esse hábito para a vida adulta.

4) Mesada é uma ferramenta educacional

Sempre cabe a cada família, obviamente, decidir sobre como, quando e por que inserir a mesada. Mas eu sugiro às famílias que evitem atrelar o recebimento da mesada com as tarefas da casa, pois se trata de uma ferramenta educacional e não um salário. Por outro lado, ajudar nas tarefas de casa deve ser obrigação de todos os membros da família, sem necessidade de remuneração.

5) Necessário ou supérfluo?

Pais não devem impor a maneira de usar o dinheiro aos seus filhos, nem proibir seus gastos. Uma boa forma de ensinar sobre o que é importante e o que é supérfluo é fazer com que os filhos paguem da própria mesada alguns dos seus gastos extras, como a pizza que ele pede para ser comprada no meio da semana e que será compartilhada com todos, ou mesmo aquela solicitação de compra de “Roblox”.

A ideia não é classificar certas despesas como “inúteis”, mas incentivar as crianças a pensarem bem antes de gastar o dinheiro.

6) Estude para se tornar um bom empregador

Os pais devem ensinar a ideia de que o dinheiro que forma a economia de um país vem do trabalho e do empreendedorismo. Aos 13 anos de idade, é bom que as crianças já comecem a pensar em maneiras de ganhar dinheiro quando tiverem 16. Isso não significa que elas terão, necessariamente, que arrumar um emprego formal, mas devem, pelo menos, buscar fontes de renda alternativas à mesada.

E aí, vale usar a criatividade: vender itens que não sejam mais usados, games, fazer bijuteria para vender e tudo o mais que seja possível imaginar e legal, óbvio.

7) Endividado após conquista do primeiro emprego

Estudos comprovam que muitos jovens ficam endividados quando conseguem o primeiro emprego e começam a usar descontroladamente todos os recursos financeiros oferecidos por bancos e administradoras de cartões. Por isso, se tiver que quebrar para aprender, o melhor é que quebrem com o dinheiro da mesada.

Os pais devem deixar o filho quebrar e resistir às suas queixas quando, por exemplo, a família estiver passeando e a criança quiser comprar algum item desnecessário ou se o filho for um adolescente que não poderá sair no fim de semana porque já gastou toda a mesada antes de terminar o mês. A frase é pesada, mas é melhor quebrar enquanto se é jovem.

8) Não mate a sua “galinha dos ovos de ouro”

Até que as crianças cresçam e aprendam que é possível ter diferentes contas de investimentos para diferentes objetivos, ensine-as que elas não devem “limpar” a conta onde o dinheiro delas está investido: o “porquinho” ou conta digital. Os pais devem ensinar suas crianças que é essencial sempre deixar um dinheiro de reserva para emergências e para evitar endividamento em horas de dificuldade.

9) Usar cartão de crédito é o mesmo que usar dinheiro que não é seu. Se o pagamento atrasar será preciso dar ainda mais dinheiro a quem lhe emprestou

Quer dar um cartão de crédito adicional ao seu filho menor de 18 anos? A melhor idade para se introduzir o cartão de crédito é aos 14 anos. Antes disso, a mesada deve ser concedida sempre em espécie, para que a criança aprenda a manusear o dinheiro. O grande problema das pessoas com o cartão de crédito é o fato delas não verem o dinheiro, o que torna mais fácil passar dos limites.

O mais importante, porém, é explicar que o cartão de crédito é uma forma de empréstimo que se for utilizada de forma inteligente pode ser interessante, mas que se houver atraso no pagamento ou se for feito o pagamento mínimo, essa decisão implica o pagamento de juros.

Caso o seu filho extrapole os limites, deve haver uma penalidade: o valor excedente será descontado imediatamente do valor da mesada do próximo mês. 

10) Não é nobre ter o título de rei ou rainha das parcelinhas

Investimentos são mais inteligentes que longos financiamentos para comprar bens que perdem valor ao longo do tempo. Em vez de parcelar em dezenas de vezes um celular de última geração ou aquelas roupas que vêm da China ou um laptop, o melhor é poupar e fazer a compra à vista ou em um menor número de parcelas, pagando menos juros.

11) Fazer o bem faz bem

Lembra que falamos sobre o ser humano aprender por meio de modelos? Aqui, o que os pais fazem falam mais do que mil palavras. A doação deve estar incorporada à rotina de quem tem renda. A educação financeira fala sobre ser próspero e não se é próspero pensando somente em si.

Por isso, os pais devem mostrar aos filhos sobre como é importante ajudarmos a desenvolver a comunidade onde vivemos, seja com doação em dinheiro ou realizando trabalhos voluntários. Ainda assim, se for em dinheiro, essa doação deve ser contabilizada, já que é preciso se lembrar depois para onde o dinheiro foi.

12) Não existe mágica para realizarmos sonhos

As crianças e jovens precisam saber que para realizar sonhos no futuro é preciso abrir mão de algumas coisas no presente. E tudo bem.  E, às vezes, os sonhos devem ser encarados como objetivos coletivos, pelos quais a família inteira deve batalhar unida. Mandar os filhos para a faculdade, comprar uma casa própria ou até mesmo um carro para a família são sonhos de maior porte e que precisam de mais planejamento.

13) Riqueza vai além das coisas materiais

Os conceitos de pobreza e riqueza variam de acordo com o ponto de vista e a capacidade de cada um de realizar seus sonhos. Essas definições devem ser trabalhadas de maneira que as crianças não se tornem “escravas” de bens materiais e evitando que elas associem “sucesso” a ter dinheiro.

14) O “Banco do Papai e da Mamãe” encerrou as atividades

Apoiar o desenvolvimento pessoal e profissional dos nossos filhos e amá-los não representam ter que sustentá-los para sempre, exceto quando a condição deles exija essa dependência.

Muitos pais reclamam que seus filhos estão adultos e nem pensam em sair de casa, mas incentivá-los nesse sentido também é responsabilidade dos pais. Um jovem de vinte e poucos anos que ganha seu salário, mas não ajuda nas despesas da casa, dificilmente vai querer morar sozinho. E se os pais não disserem nada, ele certamente não irá entender que já é hora de sair.

Preparar as nossas crianças e jovens para que cresçam seguros e tranquilos com relação às possibilidades com o dinheiro e as finanças; que façam escolhas financeiras inteligentes ao longo de suas vidas e transmitam esse conhecimento por gerações. Isso nos dá a sensação de missão cumprida.

A opinião e as informações contidas neste artigo são responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, a visão da SpaceMoney.