segunda, 29 de abril de 2024
Ações

Como o governo se posiciona sobre Eletrobras (ELET3)(ELET6), Petrobras (PETR3)(PETR4) e Vale (VALE3)

Interlocutores modificam conselhos, interferem em políticas de remuneração, e, em contrariedade a acionistas, buscam redirecionar empresas para o complemento de políticas públicas

13 março 2024 - 12h46Por Lucas de Andrade
Luiz Inácio Lula da Silva (PT), presidente eleitoLuiz Inácio Lula da Silva (PT), presidente eleito - Crédito: Rovena Rosa, para a Agência Brasil

Nas últimas semanas, a Petrobras (PETR3)(PETR4) e a Vale (VALE3) têm causado grande aflição entre investidores em razão de sinalizações de possível interferência política. 

Na petroleira, o governo federal ocupa a posição de maior acionista, detentor de 3,74 bilhões de ações, representativas de 28,6% do capital social total da companhia.

Ao longo dos últimos meses, a gigante nacional de petróleo foi alvo de críticas diretas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), desde que o mandatário retornou ao Palácio do Planalto para cumprir o seu terceiro mandato.

 

Outro governo, outros interesses — uma interferência maior

Em meio às críticas, o petista apontava que a petroleira não poderia se esquecer de cumprir sua função social e papel estratégico para o País, e, entre outras declarações, afirmou que quantias mais significativas poderiam ser redirecionadas para investimentos e os lucros destinados a dividendos poderiam ser reduzidos

Além disso, o presidente criticou a privatização da ex-BR Distribuidora, atual Vibra Energia (VBBR3), e a companhia sinaliza um possível retorno ao mercado de distribuição de combustíveis. 

O capítulo mais recente de toda a polêmica de interferência política foi a decisão da empresa em não realizar a distribuição de dividendos extraordinários sobre os resultados apurados em relação ao quarto trimestre de 2023.

A estatal optou por reter US$ 8,8 bilhões em sua reserva de capital recém-criada e aprovar a distribuição de apenas US$ 2,8 bilhões, que, junto com recompras de cerca de US$ 550 milhões durante o trimestre, totalizam US$ 3,4 bilhões (rendimento de dividendos de 3,2%).

 

Um mesmo governo, interesses diferentes

O imbróglio dividiu posicionamentos de Jean Paul Prates (PT-RN), CEO da estatal, e Alexandre Silveira (PSD-MG), ministro de Minas e Energia (MME), que, por sua vez, se alinha mais ao que pensa o Palácio do Planalto sobre o assunto. 

A imprensa repercutiu a informação de que o diretor-presidente teria, inclusive, optado pela abstenção na votação do conselho de administração sobre o assunto. A empresa negou.

Como se não bastasse a divergência pontual, especula-se que, sobre o Plano Estratégico da companhia, veículos de imprensa reportam que são constantes as discussões em torno da transição para uma energia verde, enquanto a pasta de Minas e Energia tende a defender os interesses do setor de Óleo e Gás.

E sobrou até mesmo para quem não se envolve diretamente com a companhia no dia-a-dia.

Rui Costa (PT-BA), ministro da Casa Civil, e Fernando Haddad (PT-SP), ministro da Fazenda, acirraram a rivalidade que existe entre ambos em meio ao imbróglio da não-distribuição dos dividendos extraordinários de Petrobras (PETR3)(PETR4), de acordo com informações do blog do colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo.

Enquanto o palaciano quer mais recursos para investimentos, custe o que custar, Haddad mira o rigor fiscal. E, de acordo com Jardim, a disputa se alastrou pelas respectivas equipes.

 

Desconfiança generalizada

Como consequência, a petroleira perdeu R$ 55,30 bilhões em valor de mercado na última sexta-feira (8), data em que foi repercutido o controverso anúncio, de acordo com dados do consultor financeiro Einar Rivero, da Elos Ayta Consultoria.

Na noite da última terça-feira (12), restou a estatal negar que tenha sinalizado ou prometido distribuir dividendos extraordinários

 

A disputa sobra até para uma ex-estatal...

Mas a ofensiva do poder político não se restringe somente a estatal. Mesmo a Vale (VALE3) passou a ser assediada por interlocutores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

No início do ano, por meio da pasta de Minas e Energia, o governo federal tentou emplacar Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda, na presidência da mineradora, em meio a descontentamentos de toda a parte com Eduardo Bartolomeo, atual CEO. 

De acordo com informações do g1, o petista chegou até mesmo a marcar uma reunião com o Ministério de Minas e Energia (MME), o Banco do Brasil (BB) e a Caixa de Previdência dos Funcionários do BB (Previ).

Somente a Previ detém dois dos treze assentos no conselho de administração da mineradora, que decide não apenas quem comanda o conselho em si, mas também quem preside a companhia.

Bartolomeo acumula críticas dentre integrantes do governo petista e mesmo entre os maiores acionistas, de acordo com informações veiculadas pela imprensa profissional. 

Porém, em comum acordo com seu CEO, o conselho de administração da Vale (VALE3) definiu pela extensão de seu atual mandato até o dia 31 de dezembro de 2024, bem como pela abertura do processo de sucessão, em linha com a Política de Sucessão de Presidente.

Definiu-se também que o executivo vai apoiar a transição para a nova liderança no início de 2025 e que vai atuar como advisor da mineradora até 31 de dezembro de 2025.

 

Reviravoltas penalizam governança da mineradora

Mas o processo sucessório que parecia tranquilizado foi posto à prova com a divulgação de uma carta de José Luciano Duarte Penido, que renunciou ao conselho de administração da mineradora.

Penido falou que o processo foi conduzido de forma “manipulada” e afirma que o mesmo “não atende ao melhor interesse e sofre evidente e nefasta influência política”.

No documento, disse “não acreditar mais na honestidade de propósitos de acionistas relevantes” e apontou que, no conselho de administração, “ se formou uma maioria cimentada por interesses específicos de alguns acionistas lá representados, por alguns com agendas bastante pessoais e por outros com evidentes conflitos de interesse”.

“O processo [de sucessão] tem sido operado por frequentes, detalhados e tendenciosos vazamentos à imprensa, em claro descompromisso com a confidencialidade”, completou.

O presidente do conselho de administração da Vale (VALE3) esclareceu, em nome do colegiado, no que tange ao processo de definição do presidente da mineradora, que sua atuação está rigorosamente em conformidade com o Estatuto Social.

 

O que Lula pensa e o que consegue com o que diz

Em entrevista recente, anterior à decisão final do conselho de administração, Lula declarou que a Vale (VALE3) não pode ter o “monopólio” do setor mineral, mas, sim, deve ser “mais uma” no mercado e cobrou que a mineradora deve “prestar contas” ao Brasil.

Na mesma ocasião, respondeu que não discute a sucessão do comando da companhia e sim a questão mineral. Para endurecer a crítica, citou que a empresa enfrenta problemas em Minas Gerais (MG) e no Pará (PA) e relembrou o desastre em Brumadinho (MG).

De acordo com dados do consultor financeiro Einar Rivero, da Elos Ayta Consultoria, a mineradora havia perdido, do início deste ano a última sexta-feira (8), R$ 48,30 bilhões em valor de mercado.

 

Como se desenha o processo sucessório para os investidores

No último sábado (9), o jornal O Estado de S.Paulo destacou que existe uma desconfiança de que os indicados por uma empresa de headhunting, como determina o Estatuto Social da mineradora, possam ser escolhidos num jogo de “cartas marcadas”.

 

E existe outra ex-estatal na mira do governo federal

O governo Lula (PT) espera alcançar, nas próximas semanas, um acordo com a Eletrobras (ELET3)(ELET6) para encerrar o processo movido no Supremo Tribunal Federal (STF) que contesta o número de cadeiras detidas pela União no conselho de administração da ex-estatal, apurou a CNN.

O colegiado passaria a ter onze vagas, ao invés dos nove assentos atuais, e o Executivo indicaria três integrantes ao CA, contra a vaga única existente atualmente.

O documento, protocolado pelo governo federal na Suprema Corte em maio passado, questiona o artigo 3º da Lei de Desestatização da Eletrobras (Nº 14.182/2021), que limita a 10% o direito de voto de qualquer acionista da empresa e o fato de o governo não ter votado na assembleia-geral de acionistas que deliberou sobre as condições da privatização.

Atualmente, o governo detém uma participação de 42,00% na empresa, mas os seus direitos de voto estão limitados a 10,00%. Assim, a gestão petista argumenta que foi prejudicada pela lei acima mencionada e pela decisão tomada na assembleia-geral de acionistas.

Recentemente, a empresários da Esfera Brasil, Alexandre Padilha (PT-SP), ministro das Relações Institucionais, declarou que o Palácio do Planalto não pretende mais tentar reverter a privatização da elétrica

Em entrevista mais recente, o presidente da República voltou a dizer que a privatização da empresa foi um “crime de lesa pátria”.

Perguntado se pretendia retomar o controle da companhia, desconversou, mas disse que a sociedade brasileira ainda “vai descobrir o que aconteceu” durante o processo de venda sem dar maiores detalhes. 

O petista afirmou que não gastaria “dinheiro do povo” para reverter a desestatização e alegou ter “coisa mais importante para fazer”. 

 

E então, o que fazer com as ações de Eletrobras, Petrobras e Vale?

  • - Eletrobras (ELET3)(ELET6)

 

Balanço 4T

Nesta quarta-feira (13), a Eletrobras (ELET3)(ELET6) divulga o seu balanço financeiro relativo ao quarto trimestre de 2023, após o fechamento dos mercados.

A Genial Investimentos prevê um lucro líquido de R$ 2,035 bilhões, em reversão às perdas líquidas de R$ 478 milhões em igual período do ano anterior.

O EBITDA (sigla em inglês para lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) foi calculado para vir em R$ 5,652 bilhões, uma alta de 28,4% na comparação com o apurado no mesmo intervalo de 2022.

A receita líquida deve vir 2,5% maior que entre os meses de outubro e dezembro retrasados, na cifra de R$ 9,245 bilhões.

 

Em relação à composição do CA

Em relatório repercutido pela SpaceMoney em janeiro, o Banco Safra declarou “acreditar que alterar o estatuto social da Eletrobras está fora de questão, não apenas porque seria negativa para os acionistas, mas também porque não seria uma tarefa fácil, se consideradas as muitas aprovações que envolvem a privatização da empresa e os potenciais riscos judiciais para muitas outras empresas e setores”.

Qualquer solução alternativa que envolva mais assentos no conselho para representantes do governo ou alteração da limitação dos direitos de voto seria visto como negativo, uma vez que poderia abrir caminho para a interferência do governo na empresa.

“Em suma, continuamos positivos quanto ao resultado deste processo, pois acreditamos que vai prevalecer a legislação sobre o processo de privatização”, declararam os analistas Carol Carneiro, Daniel Travitzky e Mário Wobeto, à época.

 

  • - Petrobras (PETR3)(PETR4)

A Nord Research foi categórica em sua análise: não compre PETR4. De acordo com a plataforma, nem mesmo o recorde de produção pode apoiar a tese, enquanto a estatal se enrasca numa trama de interesses políticos.

Analistas alegam, inclusive, que o motivo para não recomendar a compra não está relacionado exclusivamente à possibilidade de a companhia não ter dividendos extraordinários relativos ao quarto trimestre passado, mas sim “às mudanças no plano estratégico da Petrobras e as ingerências pelos governos que a companhia sofre”.

A casa ainda vê como “inegável que, em algum momento no futuro, os desinvestimentos sejam retomados, principalmente no onshore, que fica mais desinteressante financeira e operacionalmente a cada dia que passa para uma empresa do tamanho da estatal”.

“Enxergamos um péssimo movimento do governo ao se posicionar de forma contundente na gestão das empresas. Vimos isso no passado, quase quebrou a Petrobras. Ficamos de fora”, completou a Nord Research.

 

Atualmente, cerca de 73,88% das ações da mineradora estão com investidores minoritários. O restante do quadro acionário da companhia se divide entre:

  • - a Previ (Fundo de Previdência de funcionários do Banco do Brasil - BBAS), com 8,70% dos papéis;
  • - a Mitsui, com 6,30%; e
  • - a Blackrock, gestora norte-americana de investimentos; e, por último,
  • - a tesouraria da Vale, com 5,30% das ações.

 

“Nos últimos seis meses, o mercado assistiu a uma considerável volatilidade nas ações da Vale. Os papéis saíram da casa dos R$62,96 em agosto do ano passado, para algo em torno de R$66,50 em fevereiro. Essa variação deriva de diversos fatores, como, por exemplo: o balanço da empresa, compras e negociações e fatores políticos”, comentou Lucas Sharau, sócio partnership da iHUB Investimentos.

Sharau relembra que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já indicou Dario Durigan, secretário-executivo no Ministério da Fazenda, para o Conselho Fiscal.

O órgão detém menos poderes, uma vez que se responsabiliza tão somente pela supervisão de atos e contratação de auditorias independentes.

“A possível indicação de Mantega havia sido muito mal recepcionada pelo mercado; e assim foi com a fala de Lula sobre o controle e diretrizes da companhia. Logo após o posicionamento, vimos uma leve queda de 1,30% ou 1,40%. Esse resultado vem de encontro com o entendimento que o mercado tem sobre essa fala, um entendimento de contrariedade e aversão a uma possível controladoria ligada ou alinhada com discursos políticos. No mercado financeiro, o preço da empresa se pauta principalmente em relação às expectativas que se tem sobre o negócio, sobre a lucratividade do negócio, sobre a sua gestão e sobre o seu futuro”, diz o executivo.

Ao considerar o período de doze meses, a empresa apresentou um dividend yield de 8,89%, um ponto de interesse para investidores em busca de rendimentos periódicos.

No entanto, o desempenho no período também revelou uma depreciação de 13,42% no valor da ação, o que demanda uma análise cuidadosa da relação risco-retorno para investidores de diferentes perfis.

“A Vale deveria valer um pouco mais, as casas de análise hoje precificam um preço justo para a Vale na ordem de R$ 90,00. Há espaço para a empresa, potencial de valorização para o negócio. A Vale tende a pagar bons dividendos, nos últimos 12 meses pagou cerca de 10%, 9,5%. E é uma empresa que tem potencial de valorização”, afirma o assessor de investimentos.

O balanço da Vale tem sido detalhadamente examinado, sobretudo em função da dependência da mineradora em relação ao mercado chinês, um dos seus principais consumidores.

As discussões se intensificam em torno da capacidade de a economia chinesa manter sua resiliência diante de desafios econômicos e sanitários que impactam globalmente.

Além disso, negociações como a realizada com a empresa Anglo American, impactam na variação do preço da ação.

“Devido à crescente demanda pelo minério de ferro no mundo, assim como as perspectivas de queda de juros que trarão a necessidade de minério de ferro para construção civil, para siderurgia, para a indústria automobilística, há uma necessidade latente e esperada de consumo de minério de ferro para os próximos anos e por isso a Vale se posicionando estrategicamente”, finaliza Sharau.