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O preço da ilusão: Retórica sobre soberania não protege o Brasil de tarifas, sanções e isolamento

Entre discursos e realidade: o impacto da assimetria de poder nas relações internacionais brasileiras e os limites da diplomacia tradicional

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Brasil / tarifas / Gueratto Press
Autoridades brasileiras enfrentam desafios para defender soberania nacional diante de pressões comerciais e econômicas internacionais | Crédito: Divulgação

O montante investido pelos Estados Unidos no Brasil já ultrapassa os R$ 357,8 bilhões, conforme dados consolidados de 2024. Apesar do peso desse valor, a relação bilateral vive um momento de crescente tensão. As tarifas impostas chegam a 50% sobre produtos brasileiros. Em resposta, o governo brasileiro apoia-se fortemente na defesa da chamada “soberania nacional”. Os pronunciamentos oficiais evocam esse conceito com frequência.

No entanto, especialistas alertam: a repetição desse conceito tem efeito limitado. Sem respaldo em poder econômico, diplomático ou militar, essa postura pode ampliar o isolamento do Brasil. Com toda a certeza, o país perde espaço nos fóruns multilaterais e nos mercados globais. A retórica inflamada, nesse sentido, pode até gerar impacto político interno. Porém, dificilmente altera decisões estratégicas no tabuleiro geopolítico.

Cadeias produtivas globais

Para Kayo Fraga, CEO do Grupo Aliá, existe uma desconexão preocupante. De um lado, o tom adotado por Brasília. Do outro, as dinâmicas que regem o sistema internacional. “No cenário global, soberania não é medida por discursos, mas por capacidade de dissuasão. Potências com moeda forte impõem respeito. Países com armamento estratégico ganham voz. Nações com papel central em cadeias produtivas globais destacam-se não pelo que dizem, mas pelo que representam. O Brasil, infelizmente, ainda está distante dessa posição”, afirma.

Segundo ele, o país segue preso a um modelo diplomático ultrapassado. Esse modelo valoriza a formalidade e os princípios, é verdade. No entanto, carece de musculatura para proteger interesses nacionais. Isso fica evidente quando o Brasil confronta ações unilaterais de grandes potências. Em virtude disso, sem ajustes estratégicos, o país corre um risco real: tornar-se um ator cada vez mais periférico em um jogo geopolítico que não perdoa fragilidades.

Tarifas punitivas, sanções financeiras

A história recente confirma esse diagnóstico. Desde a Segunda Guerra Mundial, a noção de soberania plena transformou-se radicalmente. Ela foi gradualmente substituída por relações assimétricas de poder. Nesse cenário, poucos países de fato ditam as regras do comércio, da segurança e da tecnologia. Países como Rússia, China, França e Reino Unido apressaram-se em garantir seus arsenais. Além disso, blindaram sua influência global. Em contrapartida, nações como o Brasil apostaram em soft power e protagonismo regional.

Embora a diplomacia brasileira seja historicamente respeitada, ela perde força diante de instrumentos concretos. Por exemplo, tarifas punitivas, sanções financeiras e restrições tecnológicas limitam sua atuação. “Repetir que soberania não se negocia é um apelo emocional, mas no mundo real, quem não tem como sustentar suas linhas vermelhas acaba cedendo”, alerta Fraga.

Os efeitos dessa assimetria já são sentidos no dia a dia. O investidor internacional hesita diante da escalada de tensões. Ao mesmo tempo, a indústria nacional vê-se pressionada por custos crescentes. Como resultado, o cidadão comum paga a conta no câmbio e na inflação. Sem dúvida, o Brasil precisa de reformas estruturais. Necessita também de acordos comerciais estratégicos e reposicionamento internacional. Caso contrário, continuará vulnerável a decisões externas. Essas decisões reescrevem, da noite para o dia, o destino de setores inteiros da economia. Em suma, em um mundo onde soberania virou sinônimo de poder, insistir apenas no discurso é apostar alto em um jogo onde os vencedores falam pouco e impõem muito.