quinta, 25 de abril de 2024
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Não há fundamentos que sustentem o crescimento do Banco Inter (BIDI)

Preços altos mostram que avaliação de empresas digitais deve levar em conta iniciativas para obter mais clientes e gerar receita

03 setembro 2019 - 13h19Por Aislan Tito
Pois é, mas quem foi que disse que a bolsa vive só de fundamentos? Em alguns casos, muito pelo contrário. A expectativa de grande variação futura dos preços desperta ainda mais interesse dos investidores, que, por sua vez, pressionam os preços para cima, se distanciando ainda mais dos fundamentos. Gera-se, assim, o que conhecemos como especulação. Processo bem diferente, com base nos fundamentos, é seguido para a construção de um valuation de uma empresa. Aqui, o objetivo é conseguir extrair o valor real da empresa, concatenando informações microeconômicas (receitas, despesas, impostos, custos etc.) com dados macroeconômicos (taxa de juros, inflação, desempenho da economia, análise do setor etc.) para, então, projetar algo que seja coerente e factível com a realidade dessa empresa. Ocorre que não dá para utilizar o modelo de avaliação do Banco Itaú, por exemplo, para avaliar o Banco Inter, pois essas empresas encontram-se em momentos bem diferentes de maturidade. O Itaú é uma empresa estável, com receitas consistentes, e suas premissas podem ser fundamentadas com seu crescimento histórico, sua eficiência e recorrência nos resultados. Já no caso do Banco Inter, se consideradas as mesmas métricas históricas de crescimento exponencial, o resultado do seu valuation projetado para 10 anos será um banco com o número de correntistas igual à soma da população da China e Índia juntas. Isso não parece muito coerente e, muito menos, factível. A avaliação de uma empresa digital como o Banco Inter deve levar em conta ações reais que a empresa executa para obter mais clientes e gerar receita. Podemos então pensar em vertentes como:
  • inovações digitais que facilitam a vida e atraem mais correntistas;
  • segurança nas operações;
  • amplitude de cobertura;
  • números de captação e ativação de novos clientes;
  • aumento e qualificação da carteira de crédito.
Outra situação que deve ser analisada é que essas empresas de crescimento agressivo consomem muito caixa para tornar isso tudo possível. Gastos com marketing, tecnologia, novos produtos e expansão têm de ser supridos de forma consistente mesmo que os resultados não sejam satisfatórios nesse período de maturação do negócio. O objetivo delas é ganhar market share, atraindo clientes com serviços mais baratos e de fácil acesso, e no futuro aprimorar sua capacidade de monetizar o negócio com mais eficiência. Não é uma tarefa fácil consolidar tudo isso em uma modelagem financeira com projeções e premissas subjetivas mas, para sair do campo da subjetividade, vamos aos fatos relevantes. O Banco Inter foi a primeira fintech a abrir capital na bolsa de valores brasileira, a B3. Entre seu IPO, em abril de 2018, e o pregão do dia 30 de agosto de 2019, suas ações se valorizaram quase 650% (BIDI4, de R$ 3,06 para R$ 19,85). Contudo, se analisarmos os concorrentes do setor por um múltiplo chamado P/VPA (preço pago pela ação dividido pelo Valor Patrimonial da Ação), que representa o quanto o mercado está disposto a pagar pela ação frente ao seu patrimônio líquido (PL), vemos que o mercado paga pelo Bradesco (BBDC4) 1,99, quase duas vezes o seu PL; pelo Itaú (ITUB4), o mercado paga 2,65; pelo Banco do Brasil (BBAS3), 1,45; pelo Santander (SANB4), 2,18; e pelo Banco Pan (BPAN4), 2,64. Já pelo Banco Inter (BIDI4), o mercado está pagando a bagatela de 14,34 vezes o seu PL. Se você achou caro, saiba que o fundo de private equity internacional Softbank, que reúne cotistas como Microsoft, Apple e Foxconn, conhecido por investir no início das empresas Alibaba, Uber, Rappi, Loggi, Gympass, Creditas e outras, anunciou no final de julho um aporte de US$ 200 milhões no Banco Inter. A base fundamental desse aporte é simplesmente investir em algo que poderá ser muito grande no futuro, mesmo que ainda não seja tão rentável agora. Em resumo, o Banco Inter possui um potencial de crescimento gigante, ancorado em um investidor bilionário, mas que ainda apresenta muitos riscos de consolidação do negócio, de não conseguir se tornar lucrativo ou, até mesmo, de um banco tradicional ou outra fintech competir com uma plataforma digital e gratuita similar ao modelo do Banco Inter. As informações prestadas nesta coluna não são de forma alguma recomendação de entrada ou saída de qualquer ação. O objetivo é evidenciar algumas distorções ou situações que vemos acontecer no mercado, que parecem contrárias ao curso natural das coisas e que nem sempre possuem uma explicação clara por ter uma dispersão grande de cenários potenciais.