US$ 1 tri em jogo

Uma nova onda: Sell America dá lugar ao Hedge America

Sell America dá lugar ao Hedge America com US$ 1 tri em proteção cambial.

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Investidores internacionais adotam Hedge America, movimentando US$ 1 trilhão em proteção cambial contra a queda do dólar.
Fluxo global de US$ 1 trilhão marca a transição do Sell America para o Hedge America. (Fonte: Canva)

Apesar das previsões de fuga de capitais dos EUA, investidores globais seguem aplicando em ações e títulos americanos. A diferença é que agora o movimento vem acompanhado de um apetite inédito por proteção cambial — um fenômeno que marca a transição do temido Sell America para o pragmático Hedge America.

A transformação do Sell America em Hedge America

O termo Sell America ganhou força nos últimos anos, principalmente quando decisões políticas imprevisíveis de Donald Trump colocaram em xeque a confiança internacional. A tese era simples: com riscos geopolíticos e cambiais em alta, o mundo abandonaria os ativos americanos. No entanto, a realidade seguiu outro caminho. Em vez de vender, os investidores compraram ainda mais, mas com uma diferença essencial: aumentaram sua exposição ao dólar protegida por derivativos cambiais.

A corrida por ETFs com hedge

Segundo o Deutsche Bank, pela primeira vez em uma década, os ETFs de ativos americanos com proteção superaram os sem hedge. Cerca de 80% dos fluxos em fundos de ações e 50% na renda fixa entraram nessa modalidade em 2025. O fenômeno é revelador: a convicção no mercado americano permanece, mas o dólar perdeu parte de seu brilho como porto seguro.

A pressão sobre o dólar

As operações de hedge amplificam a pressão vendedora sobre a moeda. Ao antecipar a venda do dólar em contratos futuros, os fundos acabam acelerando sua desvalorização, que já acumula queda de 9% em 2025, o pior desempenho desde os anos 1970. Isso reforça o paradoxo: o Sell America não se materializa nas bolsas, mas encontra eco no câmbio.

Federal Reserve e custo da proteção

Outro fator que favorece a escalada do Hedge America é a política monetária do Fed. Com cortes de juros sucessivos, o custo de travar o câmbio caiu, tornando o hedge mais barato e acessível. O investidor global, antes relutante em pagar pela proteção, agora vê nela uma necessidade estratégica.

O impacto de US$ 1 trilhão

Analistas estimam que o volume de operações de hedge alcance US$ 1 trilhão — apenas um retorno ao patamar da década passada, quando o fortalecimento do dólar levou investidores a abandonar esse tipo de defesa. Hoje, com tarifas, juros e pressões políticas moldando o cenário, a lógica se inverte.

O papel dos fundos de pensão

Segundo o Goldman Sachs, a mudança é puxada principalmente por fundos de pensão globais, conhecidos por decisões lentas, mas consistentes. Isso indica que o movimento não é pontual, mas estrutural: o Hedge America deve se consolidar nos próximos anos.

A leitura estratégica dos bancos

Para estrategistas do Standard Bank, a equação é clara: investidores podem gostar das ações e da curva longa de juros americana, mas não querem carregar o dólar sem proteção. A moeda, antes vista como “ativo supremo”, agora passa a ser tratada como risco adicional.

Lições para o investidor brasileiro

Aqui no Brasil, o fenômeno global traz aprendizados cruciais. Como lembra Fábio Murad, criador do método Super ETF, “não faz sentido construir riqueza em uma moeda estruturalmente fraca como o real. Quem pensa em independência financeira precisa dolarizar parte do portfólio e buscar renda passiva em ETFs internacionais”.

O dilema do real frente ao dólar

Enquanto o real perdeu mais de 80% de valor desde 1994, o investidor global se protege com hedge e ativos sólidos. Para o brasileiro, ignorar esse movimento é abrir mão de patrimônio no longo prazo. John Bogle, fundador da Vanguard, reforça esse raciocínio ao defender a simplicidade dos fundos indexados: possuir o mercado é sempre superior a tentar adivinhar seus rumos.

ETFs como escudo estratégico

Os ETFs americanos, com baixas taxas e ampla liquidez, permitem ao investidor brasileiro seguir a mesma rota do Hedge America. Ao adicionar operações como covered calls, é possível transformar simples proteção em fonte de renda recorrente em dólar.

O futuro do Sell America

O Sell America pode não ter se concretizado como fuga dos EUA, mas sua “versão 2.0” — o Hedge America — já movimenta trilhões. O mercado entendeu que os Estados Unidos seguem como epicentro de oportunidades, mas não imunes a riscos cambiais. A estratégia não é abandonar a América, e sim permanecer nela com cautela, disciplina e hedge.

No fim, a lição é clara: investir globalmente nunca foi tão necessário. Mas, como ensina John Bogle, o caminho da prosperidade está menos na especulação e mais no bom senso, custos baixos e visão de longo prazo.