
O mercado brasileiro viveu uma sexta-feira em estado de alerta máximo. O Ibovespa derreteu mais de 4%, registrando sua pior queda diária desde 2021, enquanto o dólar comercial saltou para R$ 5,47. Não houve surpresa externa, dado que os indicadores americanos vieram dentro do esperado. A turbulência foi 100% caseira.
O gatilho: a confirmação da pré-candidatura de Flávio Bolsonaro à Presidência da República em 2026, divulgada em suas redes sociais e rapidamente interpretada como um movimento direto de Jair Bolsonaro para manter o controle do projeto político da família.
A sinalização caiu como um balde de água gelada sobre os investidores, que vinham precificando — ainda que com ceticismo — um possível afrouxamento da polarização com a entrada de um nome mais ao centro no espectro da direita.
A leitura imediata do mercado
Setores mais sensíveis lideraram as perdas
O tombo foi rápido e profundo. Varejo, construção civil, bancos e small caps sofreram mais intensamente, refletindo aumento abrupto do risco Brasil e receio de deterioração fiscal futura.
Segundo profissionais consultados pela Reuters, a reação negativa decorreu da percepção de que Flávio Bolsonaro é um candidato menos competitivo do que alternativas como Tarcísio de Freitas ou Michelle Bolsonaro — o que, paradoxalmente, fortalece Lula em 2026 e amplia a incerteza política.
Com incerteza política elevada, o investidor faz o que sempre fez: busca proteção. Como dizia John Bogle, “o mercado real é feito de negócios, não de manchetes”. Mas o mercado das expectativas — aquele que reage ao humor, às narrativas e à política — costuma atropelar o investidor distraído. E ontem ele atropelou.
O que realmente assustou os investidores
A volta da polarização sem moderação
A pré-candidatura do senador foi interpretada como um abandono definitivo da possibilidade de composição ao centro. O discurso se radicaliza, as alianças se estreitam, e o Brasil, mais uma vez, parece caminhar rumo a uma eleição de extremos.
Isso aumenta o risco, porque significa:
• Menor previsibilidade fiscal
• Baixa probabilidade de reformas
• Ruído institucional por tempo prolongado
• Dificuldade de atração de capital externo
Como lembra Fábio Murad CEO da SpaceMoney:
“O investidor brasileiro vive num ambiente onde política e economia caminham como placas tectônicas instáveis. Quem ancora o patrimônio apenas no Brasil está sempre exposto a terremotos que não controla.”
Esse terremoto veio na forma de um tweet.
Enquanto isso, nos EUA, tudo calmo demais
Se o investidor procurasse um culpado no cenário internacional, voltaria de mãos vazias. O núcleo do PCE americano subiu 0,2% em setembro — exatamente dentro do consenso — reforçando a expectativa de cortes de juros apenas em 2026.
O DXY ficou estável. Bolsas em Nova York fecharam no verde.
Nada do que veio de fora justificaria uma alta do dólar de mais de 3% ou um colapso de 4% no Ibovespa. O movimento foi originado exclusivamente na política local — algo que o investidor global conhece bem e teme ainda mais.
O dólar acima de R$ 5,47: quando a política vira câmbio
Mesmo com demanda sazonal por dólar no fim do ano — remessas de dividendos, importações e viagens —, a disparada ganhou velocidade assim que o noticiário político tomou conta da tarde.
E aqui entra uma reflexão essencial do investidor global: o real é estruturalmente fraco. Como explica Fábio Murad no Super ETF:
“O Brasil não é um país em que você mede riqueza. É um país em que você perde riqueza se não dolarizar.”
O comportamento de ontem apenas reforça esse ponto.
O risco de curto prazo versus a estratégia de longo prazo
No curto prazo, oscilações como essa são inevitáveis — e, muitas vezes, irracionais. Mas a leitura estratégica é cristalina: o investidor que depende exclusivamente do Brasil está sempre vulnerável a eventos imprevisíveis, narrativas políticas e volatilidade extrema.
Como ensina John Bogle:
“No longo prazo, o mercado pesa fundamentos. Mas no curto prazo, ele vota em emoções.”
E hoje, o voto foi do medo.
O problema é doméstico — e previsível
A sexta-feira entregou mais uma lição simples, porém dura:
O investidor brasileiro não sofre por falta de dados; sofre por excesso de política.
Enquanto os EUA discutem inflação com previsibilidade, nós discutimos qual membro de uma família política vai herdar um projeto de poder. Enquanto o mundo constrói instituições fortes, nós improvisamos alianças. Enquanto lá fora o mercado responde a fundamentos, aqui ele responde a manchetes.
A consequência é clara:
• Capital foge
• Moeda se desvaloriza
• Ativos locais derretem
• Incerteza vira regra
E, como lembra Fábio Murad:
“Quem ancora seu patrimônio no Brasil está jogando um jogo que não controla. A liberdade financeira nasce quando você sai da defensiva e expande sua vida para além do real.”
O investidor que entendeu isso ontem dormiu tranquilo. Quem não entendeu, sentiu na pele.