
Mesmo após o Federal Reserve cortar os juros em 25 pontos-base, o Bitcoin não reagiu como o esperado. Em vez de subir com a melhora das condições financeiras — comportamento típico de ativos de risco —, a moeda digital recuou cerca de 2% e voltou para a região de US$ 90 mil, segundo dados do CoinGecko.
O que explica essa queda?
Especialistas apontam que a resposta está muito além do anúncio do Fed e reflete um cenário macroeconômico que o mercado já começa a precificar para os próximos meses.
O mercado não caiu por causa do corte — caiu porque o corte já era esperado
Tim Sun, pesquisador sênior do HashKey Group, afirma que a reação negativa não está ligada ao corte em si, mas à leitura de que o ambiente macro deve se tornar mais complexo, com menos espaço para novos estímulos.
Segundo ele:
“A queda do Bitcoin não é reação ao corte, mas ao mercado antecipando um cenário macroeconômico mais complicado. Os cortes estavam totalmente precificados.”
Ou seja: o mercado não ganhou nada novo com a decisão.
Fed sinaliza limite para novos cortes — e isso pressiona os ativos de risco
Apesar de Jerome Powell não ter adotado um tom agressivo, o dot plot mostrou que o Fed revisou para baixo as expectativas de cortes para 2026. Em resumo:
- o ciclo de afrouxamento pode estar perto do fim,
- o espaço para novos cortes diminuiu,
- e o mercado agora trabalha com juros altos por mais tempo.
Isso reduz o apetite por risco e pressiona ativos sensíveis às taxas — como o Bitcoin.
2026: o ano que pode redefinir o risco macro nos EUA
Sun também destacou um fator pouco discutido, mas altamente relevante:
as eleições de meio de mandato de 2026, sob uma administração que exigirá:
- política fiscal mais frouxa,
- Fed mais dovish,
- estímulo econômico para manter a atividade aquecida.
Essa combinação pode gerar o que ele classificou como:
“Um estímulo simultâneo fiscal e monetário.”
Algo raro — e potencialmente perigoso.
O risco da volta da inflação — o pior cenário para o Bitcoin
O analista alerta que essa mistura é:
“Altamente propensa a reacender a inflação, elevando novamente as taxas de longo prazo.”
E quando as taxas longas sobem, todo o mercado de risco sofre:
- ações caem,
- criptos recuam,
- liquidez global diminui,
- o custo de oportunidade aumenta.
O Bitcoin, sensível a esse movimento, fica sob pressão adicional.
IA, energia e infraestrutura: os novos vilões inflacionários
Além do risco fiscal, cresce a preocupação com o aumento dos gastos de capital em inteligência artificial, que já eleva custos de:
- energia,
- mineração de dados,
- capacidade computacional.
Para Sun, esse movimento cria uma inflação mais persistente e “pegajosa”, reforçando a tese de que o Fed pode ser forçado a voltar a subir juros — ou ao menos manter níveis restritivos por mais tempo.
Sinais do Fed apontam cautela — e o mercado leu isso como um alerta
John Haar, diretor-gerente da Swan Bitcoin, destacou que o Fed usou uma linguagem restrita, prudente e preocupada com dados de emprego, inflação e atividade econômica. Além disso, chamou atenção para:
- a primeira expansão relevante do balanço do Fed desde 2022,
- compras de até US$ 40 bilhões em T-Bills,
- reversão parcial do processo de aperto quantitativo (QT).
Para Haar, essas medidas reforçam que o Fed enxerga riscos estruturais — e o mercado cripto captou essa mensagem.