O avanço gradual do yuan abre espaço para uma nova rodada de valorização das moedas de mercados emergentes — incluindo o real — em um ambiente de juros mais baixos nos EUA. A sensibilidade dessas divisas ao yuan ficou clara no último ano: para cada variação de 1% da moeda chinesa, baht (Tailândia), ringgit (Malásia), peso chileno, peso mexicano e real exibiram movimentos próximos. A correlação de 30 dias entre dólar–yuan e o índice MSCI de Moedas de Emergentes subiu para 0,59 no fim de agosto, a maior desde maio de 2024.
Por que o yuan virou a “âncora” regional
A China é o principal parceiro comercial de grande parte da Ásia. A política cambial de Pequim costuma orientar decisões dos vizinhos e, por efeito de comércio e commodities, influencia também América Latina e outras regiões. Quando o yuan se fortalece, moedas asiáticas tendem a acompanhá-lo, permitindo políticas monetárias mais flexíveis nos bancos centrais locais.
O gatilho recente: sinal do PBOC
Em 9 de setembro, o Banco Popular da China (PBOC) fixou a taxa de referência do yuan no patamar mais forte desde novembro, após meses guiando a moeda acima do esperado desde julho. No ano, o yuan onshore já se valorizou mais de 2% contra o dólar, revertendo parte de três anos de desvalorização. Gestores de hedge elevaram apostas otimistas, mirando a região de 7 por dólar até o fim do ano (o par estava em torno de 7,12 na sexta-feira).
Efeito dominó: real e peers ganham tração
Observadores do mercado veem espaço para retomada do rali das moedas emergentes. Para Eric Fine (VanEck), o yuan é o “principal cruzamento” para os emergentes, que hoje negociam mais com a China do que com os EUA — um pano de fundo que tende a favorecer os EM como um todo. Para Brad Bechtel (Jefferies), permitir uma apreciação gradual do renminbi pode fazer parte da negociação comercial EUA–China e abrir caminho para ganhos sincronizados nas moedas asiáticas.
América Latina na linha de transmissão
O Brasil, grande exportador de commodities e com vínculos comerciais crescentes com a China, está nessa linha de transmissão. Um yuan mais forte costuma reduzir a pressão do dólar e melhorar os termos de troca para exportadores, fatores que, combinados, tendem a favorecer o real — principalmente se os EUA retomarem cortes de juros, como o mercado aguarda para a próxima reunião do Fed.
Desdolarização e liquidez: tendências em curso
A China intensificou a campanha para ampliar o papel global de sua moeda. Um yuan estruturalmente mais forte reforça movimentos de desdolarização na Ásia no longo prazo, observa Christopher Hamilton (Invesco). Para investidores, isso pode significar maior liquidez e participação do yuan em contratos e financiamentos regionais — com reflexos indiretos sobre fluxos para moedas de emergentes.
O que acompanhar daqui para frente
1) Sinalização do PBOC
Mudanças no nível da taxa de referência e no tom das comunicações do banco central chinês.
2) Agenda do Fed
Retomada dos cortes e leitura do balanço de riscos para crescimento e inflação nos EUA.
3) Dados de comércio e commodities
Volumes, preços e balança comercial da China, especialmente em metais e energia, que afetam termos de troca do Brasil.
4) Fluxos para fundos EM
Entradas e saídas de capital em títulos locais e cambiais de emergentes, sensíveis ao apetite global por risco.