As Tesourarias de Ativos Digitais (DATs), empresas que compram grandes quantidades de criptomoedas e as transformam em veículos de capital aberto, viveram um dos períodos mais exuberantes da história recente do setor. Mas, segundo Tom Lee, presidente da BitMine, “a bolha já pode ter estourado” — e o mercado começa a enxergar os sinais de esgotamento .
No auge do ciclo, as DATs chegaram a ser vistas como uma ponte entre Wall Street e o mundo cripto. Ao acumular moedas como Bitcoin ou Ethereum, essas companhias permitiam que investidores acessassem o mercado de ativos digitais sem precisar operar diretamente em corretoras especializadas.
Contudo, a recente queda nas avaliações e o aumento do número de novas empresas do tipo acenderam o alerta vermelho.
Ethereum segue sendo a “blockchain de Wall Street”
Lee, que ficou conhecido como um dos primeiros analistas de bancos tradicionais a defender o Bitcoin quando ainda era estrategista do J.P. Morgan, assumiu a liderança da BitMine com a meta ambiciosa de torná-la a maior detentora institucional de Ethereum no mundo.
Hoje, a empresa já possui 3 milhões de tokens, cerca de 2,5% do fornecimento global, avaliados em mais de US$ 15 bilhões. O objetivo é alcançar 5% do total circulante.
“Somos essencialmente uma ligação entre como Wall Street vê o futuro do Ethereum”, afirmou Lee durante o podcast Crypto Playbook da Fortune .
Apesar dos desafios técnicos da rede, ele mantém a crença de que o Ethereum continua sendo “a blockchain de Wall Street” — especialmente à medida que bancos e instituições financeiras passam a testar stablecoins e ativos tokenizados sobre sua infraestrutura.
“Se isso não é o estouro de uma bolha, o que seria?”
O entusiasmo, porém, parece ter ultrapassado os fundamentos. Um número crescente de empresas de tesouraria cripto está sendo negociado abaixo do valor patrimonial líquido (NAV) — ou seja, valendo menos do que o próprio valor dos ativos digitais que detêm.
“Várias DATs estão listadas com desconto sobre suas carteiras. E mais companhias desse tipo seguem sendo lançadas a cada mês. Se isso não é o estouro de uma bolha, o que seria?”, questionou Lee .
A analogia com o movimento iniciado por Michael Saylor na MicroStrategy, em 2020, é inevitável. Na época, a compra massiva de bitcoins corporativos inspirou dezenas de empresas a seguirem o mesmo caminho. Agora, parte delas enfrenta o que parece ser o fim de um ciclo de euforia.
Risco de concentração e lição para investidores
Para o Fábio Murad, CEO da SpaceMoney e criador do método Super ETF, o estouro das DATs é um lembrete de que exposição concentrada em um único tipo de ativo digital representa alto risco estrutural.
“O investidor precisa entender que tecnologia e preço são coisas diferentes. Você pode acreditar na inovação do blockchain, mas isso não justifica alocar 100% do patrimônio em ativos de altíssima volatilidade”, afirma Murad.
Ele reforça que disciplina e diversificação global são pilares de qualquer carteira inteligente:
“Enquanto muitos buscam o próximo ‘boom’ cripto, o investidor de verdade busca renda passiva previsível, como fazemos com ETFs internacionais e operações Covered Call em dólar. É assim que se constrói riqueza real”, conclui Murad.
Uma correção que pode fortalecer o setor
Embora o mercado tema o colapso, especialistas avaliam que o atual movimento pode ser saudável. Assim como ocorreu em outras bolhas tecnológicas, o excesso de capital tende a ser eliminado, abrindo espaço para empresas mais sólidas sobreviverem.
As DATs que mantiverem transparência de governança, reserva real de criptoativos e estratégias sustentáveis podem sair fortalecidas.
Em um contexto de maior regulação e escrutínio, o setor pode evoluir — menos como uma promessa especulativa e mais como uma ponte estável entre o mercado financeiro tradicional e o universo digital.
O investidor de bom senso
A lição final é antiga: o que John Bogle, criador dos fundos de índice, defendia há décadas continua atual. O mercado recompensa a paciência, não a euforia. Investir com método e custos baixos segue sendo a forma mais eficiente de capturar o valor real da economia — digital ou não.