terça, 16 de abril de 2024
SpaceDica

Segurança e descentralização: o que esperar do marco regulatório das criptomoedas?

Analistas se dizem entusiasmados com a aprovação da lei, mas ponderam para riscos que o excesso de regulamentação pode trazer aos ativos digitais

19 abril 2022 - 15h00Por Lucas de Andrade

Você já ouviu falar em criptomoedas como Bitcoin (BTC), Ethereum (ETH) e Solana (SOL). Só no Brasil, o mercado desses ativos digitais movimentou mais de R$ 200,7 bilhões ao longo do ano passado.

O número chama a atenção principalmente quando se compara o volume negociado com o de investimentos acumulados em modelos tradicionais como o Tesouro Direto, que contabilizou R$ 79 bilhões no mesmo período. Entretanto, apesar do alto número de negociações, as operações são realizadas à margem da legislação.

Ao encontro dessa realidade, o Senado Federal pautou para esta terça-feira (19) a votação do Projeto de Lei n° 3825/19, que estabelece o marco regulatório do mercado de criptomoedas no Brasil.

O texto foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) em fevereiro, com o acolhimento do substitutivo do senador Irajá Abreu (PSD-TO) a três matérias apresentadas pelos senadores Flávio Arns (Rede-PR), Soraya Thronicke (PSL-MS) e Styvenson Valentim (Podemos-RN).

Os recursos em criptomoedas, chamados no mercado de criptoativos, tokens, ativos virtuais, ou digital assets, são guardados e negociados por empresas conhecidas como exchanges ou corretoras de ativos virtuais. 

Com o marco regulatório, parlamentares querem dar um novo status a esse mercado. Analistas recebem a proposta com entusiasmo, principalmente em relação à segurança das negociações, mas alertam para a necessidade de se manter a alma das criptomoedas: liberdade e descentralização.

"Da forma como foi proposto, o marco legal visa regulamentar exchanges - corretoras de criptos -, para que elas tenham endereços fiscais e a definição de um órgão regulatório a ser escolhido pelo Executivo e pelo Banco Central (BC). Acredito que o texto traz vantagens tanto para as empresas idôneas, que trabalham a favor do mercado, quanto para os usuários finais, que somos nós, investidores", avalia Luiz Pedro Andrade, analista de criptoativos da Nord Research

O especialista lembra que atualmente mais de quatro milhões de pessoas registraram seus CPFs em corretoras e têm interesse ou já negociam esses ativos digitais. 

Criptos não são terra de ninguém

Para Tasso Lago, gestor de fundos privados em criptomoedas e fundador da Financial Move, a regulamentação tem como principal efeito evitar que alguns golpes ocorram em relação às corretoras. Ele relembra o caso do Grupo Bitcoin Banco, cujo proprietário era Cláudio José de Oliveira, conhecido como "Rei do Bitcoin".

A falsa empresa teria sido responsável pelo desvio de até R$ 1,5 bilhão em negociações que simulavam a compra e venda de criptomoedas

"Embora as criptomoedas representem liberdade, vejo muita gente se aproveitar disso. Então medidas que buscam identificar as pessoas envolvidas nas transações, ver para onde vai o dinheiro e evitar que qualquer pessoa abra uma corretora são necessárias para termos um mercado mais sadio. Óbvio que regulamentação demais prejudica, mas evitar novas fraudes e pirâmides financeiras tem sido algo que a gente tem lutado por esse mercado", diz.

Alessandro Quraitem, co-fundador da CriptoLabz, comunidade paga para investidores hospedada na Hubla, concorda com Lago. Ele avalia que as negociações devem ser protegidas por um marco legal, mas sem excessos, para que a evolução tecnológica das criptomoedas não seja prejudicada.

"A descentralização representa a alma do negócio, a essência da criação. Hoje temos uma constante evolução nessa tecnologia, desde 2009 - o que eu acho bem recente. Tudo deve ser feito com o maior cuidado para não ter um único órgão ou empresa controladora de todo o ecossistema".

Quraitem afirma que as criptomoedas pouco a pouco conquistam o seu espaço no sistema financeiro tradicional. Por exemplo, no Imposto de Renda (IR), você consegue declarar o que tem investido nesses ativos digitais. "Mas a Receita Federal, por exemplo, não consegue ver o quanto você tem em criptomoedas caso esses recursos estejam registrados em uma corretora descentralizada", ressalta.

No ano passado, a Receita Federal já havia introduzido três códigos para o contribuinte declarar ativos digitais. Neste ano, o contribuinte terá à disposição mais um código, voltado exclusivamente para os NFTs (sigla em inglês para tokens não fungíveis).

Regulamentação deve aumentar adesão

Já Andrey Nousi, CFA e fundador da Nousi Finance, pontua que a falta de uma estrutura legal que determine o que são crimes financeiros ou não, dentre outros fatores, até aqui prejudicou o sistema financeiro como um todo. 

"A grande maioria das pessoas envolvidas na negociação de criptomoedas são legítimas, querem fazer um bom trabalho, mas têm suas imagens manchadas por conta de pequenos agentes do mercado financeiro que querem ludibriar os investidores".

O executivo acredita que a legislação torna o ambiente de negócios por meio de ativos digitais no Brasil mais seguro e deve atrair mais pessoas para o mercado. 

"Mostra como damos atenção a esse tipo de mercado, que o país ainda pode triunfar bastante, que temos muita demanda para investir. Com uma estrutura legalizada, que passe confiança para os investidores, mais pessoas podem entrar nesse mercado sem se preocupar que em qualquer empresa haja o risco de cair em meio a um esquema de pirâmide", completa.